quarta-feira, 29 de junho de 2011

TRÊS DEDOS PELA CANA (TIO FRUTO)

Lembro-me de que a primeira vez que o vi, foi na cidade de Porto Seguro, atual Guadalupe, no Piauí, onde morava e era proprietário de uma farmácia, salvo engano.
         Figura muito simpática, palestra agradável, tinha muitos conhecimentos gerais, embora não tenha freqüentado boas escolas. Inteligente e excelente narrador de histórias, principalmente em se tratando de acontecimentos de sua vida, quando morou no Amazonas, na sua mocidade.
         Refiro-me a Frutuoso Silva - o meu tio “Fruto”, como carinhosamente era tratado.
         Muitos anos depois fomos nos encontrar, desta vez já em Teresina, para onde se transferiu com a família e eu também, para iniciar os meus estudos.
         Ali é que eu tive a oportunidade de conhecer melhor aquele grande amigo. Foi em Teresina que a nossa amizade se consolidou e se tornou imorredoura. Guardo as melhores recordações dos dias que ele passou dirigindo a farmácia “Collect”, ocasião em que moramos juntos em companhia de alguns primos, sob a sua orientação.
         Tinha a aparência tranqüila. Nos primeiros contatos já se tornava amigo das pessoas. Agora, tinha uma particularidade interessante: gostava de polemizar os fatos, gostava de discutir, de argumentar. Era tal como eu, um grande contestador.
         Certa ocasião chegou por lá um cidadão procurando vender a ele um estojo contendo trezentos vidros de remédios homeopáticos para as mais variadas doenças. Ele não acreditava naquilo. Achava que tudo não passava de um engodo. Logo fez a seguinte proposta ao vendedor:
         - Pois bem, eu me comprometo a comer com farinha todo o conteúdo desses vidros. Se não me acontecer nada eu não pago coisa alguma. Se acontecer qualquer efeito eu pago o prejuízo total, disse ele.
         O homem pulou bem acolá. Parece que se tratava mesmo de “cascata” e o tio Fruto tinha toda a razão.
         Outra muito boa dele: chegamos lá um dia, ele estava de posse de um rifle surdo, calibre 22, de dentro do quintal da farmácia atirando nos isoladores dos postes. Não errava um.
         Em outra ocasião o meu irmão Aluízio encontrou-se com ele, na Praça Rio Branco, e foi logo comunicando:
         - Tio Fruto, acabei de tomar uma grande resolução!
         - E que resolução foi essa tão importante assim?, perguntou.
         O Aluízio muito eufórico disse:
         - Deixei de fumar!
         Logo veio a invencível argumentação do tio Fruto:
         - Pois você acaba de fazer uma grande besteira. Continue fumando o seu cigarrinho, que não lhe faz mal algum, o que prejudica é o excesso, o abuso do cigarro, fumar dois, três maços por dia, isso sim é prejudicial...
         E assim por diante. No meio da conversa o Aluízio já estava pedindo licença para ir até o Bar Carvalho para comprar uma carteira do velho “Selma” (cigarro da moda, na época).
         Mas a história que considero melhor do tio Fruto, foi a seguinte.
         Apareceu em Teresina naquela época o Circo Jardim Zoológico, muito bem montado, com grandes atrações, entre as quais um gigante com força descomunal, capaz de segurar dois automóveis, um de cada lado, e não deixar que os mesmo andassem. Dobrar uma barra de ferro de boa envergadura e tantas outras coisas. O homem estava mesmo causando grande admiração.
         Uma noite ele disse:
         - Eu hoje vou lá para ver esta “fera”.
         E foi mesmo. Ao voltar, nós já estávamos na expectativa para ouvir a sua impressão. Lá vem ele, de longe tirou logo a camisa  - o calor de Teresina é de lascar. Perguntamos:
         - Que tal o homem, tio Fruto?
         A resposta veio em cima das buchas:
         - Não vale coisa nenhuma... Aquele bestalhão não tem a força de uma galinha! O homem faz o maior esforço do mundo só para aparecer dois novelinhos em cada braço, concluiu  de forma categórica.
         Estava se referindo à musculatura do gigante, e completou:
         - Aquele eu derrubo com “três dedos pela cana”, com a maior facilidade.
         O tio Fruto era assim e foi assim que aprendi a lhe querer bem.
         Casado com Zoráide Benvindo da Silva (tia Zora), de saudosa memória, criatura boníssima.
         Os filhos estão hoje muito bem colocados, nas mais variadas profissões.

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