quarta-feira, 29 de junho de 2011

O “PEQUINHA”

         Só se sabe que o seu primeiro nome era Pedro e que veio para Balsas da região de Carolina. Trabalhou muitos anos na residência do Alexandre, onde prestou serviços apenas de natureza mais pesada, pois era débil mental. Falava com muita dificuldade. Contudo, em determinadas ocasiões de sua vida, até que demonstrou não ser totalmente desprovido de inteligência, ao contrário, provou que existem muitos mistérios na natureza humana.
         Sempre morou só, não casou e sua grande mania era selecionar figuras de mulheres nuas e perfumes. As paredes de seu quarto eram decoradas com fotografias de mulheres “peladas”, no que até possuía muito bom gosto. Gastava grande parte de seu ordenado na compra de perfumes, os mais variados.
         No tempo em que não havia água encanada em Balsas, essa era transportada do rio, naquela velho sistema de duas latas de querosene, presas por um pedaço de madeira que se colocava no ombro. Um trabalho penoso, tendo em vista a distância e a ladeira que se enfrentava para alcançar o rio. Trabalho difícil, uma dureza.
         Pois bem, um dia o Alexandre chamou o Pequinha e procurou convencer o “cabra” para fazer no seu quintal um grande canteiro para plantar verduras, prometendo dar para ele a grande soma de vinte mil réis, um bom dinheiro na época. Foi aí que o Pequinha rejeitou a proposta tentadora, com este argumento:
         -  Quero não, depois tem que “moiá”!
         Estava prevendo o trabalho que iria ter para carregar água para molhar a futura plantação. Era o besta...
         Certo dia o Pequinha cismou de voltar para Carolina. Conseguiu um carrinho de mão (acho que ele mesmo o fez), colocou um lugar para por os cigarros, comprou alguns mantimentos, suas mudas de roupa, tudo que tinha e se mandou a pé. Vejam que “não é mole” uma viagem de Balsas a Carolina, no “pé-dois”. Ainda mais naquele tempo, que não havia estrada, enfrentando aqueles imensos desertos de areia, dificuldades de toda ordem. O Pequinha era mesmo um danado...
         Mas a sua maior proeza, na qual ele mostrou que era um homem de muita coragem e determinação, foi a seguinte.
         Ele mesmo construiu um “macaco” de buriti. Para quem não sabe, informo que macaco é uma embarcação primitiva construída com alguns talos daquela madeira, talvez um cinqüenta ou cem, amarrados com embiras. Uma vez colocado dentro d’água não afunda e desce o rio ao sabor da correnteza, guiado por um pequeno remo. Pois bem: o Pequinha teve coragem de embarcar numa geringonça dessas, só ele e Deus. 
         Tocou de cabeça abaixo enfrentando toda sorte de dificuldades, cachoeiras e tantos outros perigos, chegando a Teresina depois de dezessete dias de viagem estafante. Se fosse hoje em dia a Globo não dispensaria uma reportagem. Seria um prato cheio.
         Chegando a Teresina o Pequinha foi para a nossa companhia, onde trabalhou por algum tempo. Em nossa casa era alvo de muitas brincadeiras por parte daquela estudantada que havia por lá, nossos irmãos e primos. De tanto apelido que recebeu, deu para formar um time de futebol, que ficou assim constituído: “Boca Larga”, “Mandubé” e “Buldogue”, “Selado”, “Pequinha” e “Bicudo”; “Barrigudo”, “Boca de Carneiro”, “Cabeção”, “Jubileu” e “Jegue”. Tem quem possa com uma turma dessa ?     
         De uma hora para outra o nosso Pequinha desapareceu, sumiu. Sentimos a sua falta, mas ninguém sabia para onde tinha ido.
         Um dia depois, lá pelas dez horas da manhã, aparece lá na farmácia um agente polícia com uma fotografia 3 x 4 do meu irmão Pedro, que era tenente do Exército, na época. Disse o agente:
         -  Doutor Ribeirinho, o senhor conhece esta pessoa?, mostrando o retrato.
         -  Lógico, respondeu, é meu irmão.
         -  Pois esta fotografia foi encontrada em poder de um ladrão que ia fugindo com um  saco nas costas, contendo perfumes, roupas, revistas e muitas outras coisas. Já apanhou como diabo mas não quer dizer o seu nome. Está se fazendo de doido, dizendo que seu nome é Petinha - Peleletinha.
         -  Rapaz, pelo amor de Deus, não se trata de ladrão, soltem o homem!, disse o Ribeirinho e chegando à Polícia esclareceu tudo.
         Era mesmo o Pequinha que ia fazendo outra das suas. Queria fazer o trajeto de Teresina a Balsas andando e ainda com um enorme saco nas costas.
         Mais tarde veio embora para Balsas e daí para a frente não sei mais o que foi feito dele. Se alguém souber que me diga, pois gostaria muito de conhecer o final de sua vida.

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