quarta-feira, 29 de junho de 2011

O “RIBEIRINHO”

         Antônio Ribeiro da Silva (Ribeirinho), nasceu na cidade de Floriano, Estado do Piauí, no dia 01 de julho de 1910.  Transferiu-se depois para Balsas, onde nossos pais foram residir. Fez o curso primário naquela cidade, seguindo depois para São Luís, onde estudou dois anos no Seminário, mas para atender ao grande desejo de nossa Mãe, cujo maior sonho era ter um filho padre, segundo dizia. Logo verificou não ter vocação para o sacerdócio religioso, e corajosamente comunicou o fato à Mamãe, que embora muito contrariada, respeitou e lhe deu pleno apoio em sua decisão.
         Mais tarde ela mesmo reconhecia que o Ribeirinho  tinha tomado uma atitude correta, dizendo que era preferível não ter um padre na família, do que ter um que não tivesse plena vocação. Ela também usou o bom-senso.
         Matriculou-se na Faculdade de Farmácia do Maranhão, concluindo o curso em 1930. Chegando à Balsas naquele ano enfrentou logo o mais duro golpe sofrido por nossa família: - a morte do nosso querido Pai, fato que nos abalou profundamente. Sofreu uma grande decepção, visto que teve de trabalhar em um ramo de atividade completamente diferente daquele para o qual se formou. Não se adaptou ao comércio. Não tinha nascido para esse mister, certamente.
         Particularmente eu sempre disse nas nossas conversas que tivesse ficado em Balsas, com a capacidade, com a simpatia, com a sua extraordinária versatilidade, não tenho dúvidas de que em pouco tempo teria conquistado todo mundo e seria hoje uma das maiores fortunas daquela cidade.
         Era um jovem de vinte anos. Tinha outros ideais. Alimentava outros sonhos que não o de ficar rico. Pensava na sua profissão. O rumo de sua vida seria outro, completamente deferente. Quem pode dizer que errou? Quem pode desaprová-lo por isso? Ninguém, posso afirmar com absoluta convicção. Deus nos dá a nossa vida e também o sagrado direito de orientá-la para onde bem entendermos.
         Assim penso e assim pratico.
         Seguiu depois para Teresina já casado e com um filho -  o João Ribeiro -  que tinha poucos meses de nascido. A idéia da mudança partiu de minha Mãe, que alimentava o grande sonho de colocar os filhos no estudo. Na cidade grande seria mais fácil, pensava ela.
         Ali adquiriu a Farmácia  “Collect”, que dirigiu por muitos anos. Foi professor de Química do Liceu Piauiense e de outros colégios. Chegou a ser Diretor do Liceu, por algum tempo.
         Fundou a Carbolândia, uma indústria para fabricar carvão vegetal, partindo da casca do côco babaçu. Não fosse o Brasil ter entrado na Segunda Guerra Mundial, esse empreendimento teria tido o maior sucesso, pois a produção já estava vendida para São Paulo. Ficou retida em Parnaíba, logo na primeira remessa. Não deu certo. Sobre o assunto - babaçu - vamos falar mais tarde.
         Como desportista, foi Presidente do Flamengo Esporte Clube, conquistando alguns títulos de campeão. Foi à São Luís, presidindo uma caravana, onde o Clube fez brilhante figura. Foi nesse temporada que eu assisti pela primeira vez um juiz de futebol “tomar na marra” uma partida, um jogo que teria sido facilmente ganho pelo Flamengo. Foi um tal de “Badico”. Esse desgraçado teve a coragem de marcar dezoito impedimento de nosso centroavante “Fatiguê” e nove do ponta-esquerda João Pedro.  Não fosse essa ladroeira o Flamengo teria “arrasado”.
         Bem, mas vamos voltar ao assunto. A gente vai se empolgando e esquece o que vai dizendo.
         Em Teresina, Ribeirinho enfrentou uma luta difícil. A Farmácia, com capital reduzido, era insuficiente para manter a sua família e a nossa. Teve de desviar a sua atividade para outro setor. Não havia saída. Resultado: resolveu fechar a mesma e transferiu-se para São Luís, para começar outra etapa de sua agitada vida.
         Nesse meio termo tentou a vida como viajante  comercial no ramo de remédios, que era a sua especialidade. Trabalhou algum tempo mas não tinha saúde para suportar o desconforto de constantes viagens, até pela Amazônia. Deixou logo esse serviço.
         Em São Luís matriculou-se na Escola de Medicina, obtendo o Diploma de Médico, especializando-se em oftalmologia. Fabricou seus próprios aparelhos, os instrumentos de trabalho.
         Foi médico do Departamento de Trânsito durante muitos anos, onde angariou muitas amizades pela maneira atenciosa com que atendia os motoristas.
         Foi professor de Faculdade de Farmácia  e da Escola Técnica Federal do Maranhão, sendo que nessa última deixou montada uma usina piloto sobre o babaçu, assunto que dominou completamente, tendo feito conferências até nos Estados Unidos da América do Norte.
         Radioamador de larga experiência, onde ele mesmo se identificava como:
         -  O baixinho de Monte Castelo, gingongo, pé-de-poeira, dançador de recortado.
         Maçon, onde se notabilizou como grande orador.
         Exímio contador de piadas. Imitava com perfeição os personagens, como: português, alemão, japonês, árabe etc. Dificilmente se encontrava com a gente sem ter uma novíssima para contar. E tem outro detalhe importante: criava muitas histórias engraçadas. Tinha uma extraordinária capacidade para escrever, tanto em prosa como em verso. Em questão de minutos escrevia coisas interessantes.
         Lembro-me de uma ocasião que ele estava em Teresina e recebeu uma carta, de uma tia que morava em Balsas, pedindo que ele escrevesse uns versinhos para colocar no rótulo da aguardente “Jararaca”,  que competia com outra que se chamava “Cascavel”. Não contou conversa, num instante fez esta propaganda:

       Minha gente, venha ouvir
         Um caso que vou contar:
         Outro dia eu campeando
         Ouvi um grande tropel
         Era a cobra Jararaca
         Engolindo a Cascavel.
         Apeei pra ver de perto
         O caso da cobraria
         Cascavel jogava o bote
         Jararaca olhava e ria.
         Depois olhando bem
         Da Jararaca a chalaça
         Vi que tinha tomado
         Uns tragos desta cachaça.”
         Era membro efetivo da Academia Maranhense de Trovadores, de cujo estilo era grande apaixonado.
         Como professor de Química no Liceu Piauiense o Riberinho contava sempre um episódio que se passou entre ele e o aluno Selemérico Passos de Carvalho. Por ocasião de uma prova mensal que deveria se realizar, o aluno recebeu o papel da prova, não respondeu a uma só pergunta, ostensivamente se levantou e passando pelo professor, com ar de verdadeiro deboche, devolveu a prova com esta expressão:
         -  Abdico em favor de um zero!
         Resultado: recebeu um zero de cinco centímetros em letras vermelhas. Pode até parecer exagero de minha parte, ditado pela admiração que tenho por este irmão, mas, não tenho dúvidas em afirmar que foi uma das criaturas mais inteligentes que já conheci. Nunca o vi recuar diante de qualquer problema.
         Este é o meu pensamento que fica sobre o Ribeirinho: era um homem de bem, merecedor do respeito e da admiração de todos nós.

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