Pai: João Ribeiro da Silva, nasceu na cidade de Jerumenha, Estado do Piauí. Muito cedo se transferiu para Floriano, onde trabalhou por muitos anos no comércio. Quando se casou, em 1909, com 31 anos de idade, já era considerado um rapaz bem situado na vida, mercê do equilíbrio, da organização, do trabalho enérgico, da força de vontade que sempre demonstrou. Transferiu-se para Balsas depois do nascimento de seu filho - o Ribeirinho.
Chegando em Balsas iniciou uma luta que terminou em dezembro de 1930 com a sua morte, que enlutou a cidade. Foi um homem de grande visão, pioneiro em diversos setores, conseguiu formar um patrimônio grande para a época.
Sempre viveu do comércio, atividade que praticava com honestidade e perseverança.
Naquele tempo não havia estabelecimentos bancários em Balsas. O comerciante passava todo ano amealhando o produto das vendas diárias em dinheiro, para no final do ano embarcar numa balsa e seguir para os centros mais adiantados para aquisição do estoque de mercadorias a serem comercializadas no ano seguinte.
No fim do ano de 1926, no auge da grande enchente que houve no Maranhão, viajava com destino a São Luís, carregando em uma mala todo o produto que conseguiu apurar durante o ano. Eram 30 contos de réis, uma importância bastante grande, levando-se em conta que era tudo o que tinha feito no dia-a-dia de um ano de trabalho. No decorrer da viagem, enchente pavorosa, chuvas torrenciais, perigos de toda ordem. Em certo momento a balsa vai de encontro a uma pedra e se desmancha toda. Tudo acabado, tudo perdido. A mala com o dinheiro afundaram no meio do rio. Ele salvou-se a nado, já considerava o prejuízo total, tudo consumado. Graças a Deus a providência divina o ajudou. Percebendo o perigo, um parente e amigo mergulhou e segurou na alça da mala, nadando até a margem e conseguindo salvar tudo. Teve que passar uma semana na casa de um conhecido, colocando todo o dinheiro para secar ao sol. Um desastre tremendo que por pouco levaria também a sua vida. Ele nos contava esse episódio que nos marcou para sempre.
Tinha noção de conforto. Conseguiu construir uma casa em Balsas, cujo madeiramento do teto e portas ainda hoje resiste. O reboco externo ainda é o mesmo que ele deixou.
Em uma das viagens que fez a Floriano, viu lá um gasômetro a carbureto. Desenhou mais ou menos o aparelho e chegando a Balsas chamou o José Santiago (inteligente operário do ramo de funilaria), mostrou-lhe o desenho e perguntou se ele era capaz de fazer um igual. Diante da resposta afirmativa colocou mãos à obra. Conseguiu o intento. Foi a primeira casa a ser iluminada à gás em nossa cidade. Ainda hoje estão lá os vestígios do grande feito - a tubulação. No ano seguinte trouxe um aparelho de fabricação alemã, que instalado iluminou a casa e até uma parte da praça, pois colocou “bicos” de luz na esquina.
Comprou um automóvel “FORD”, modelo 1929, e em janeiro de 1930 desembarcou o mesmo no porto de Balsas, tendo vindo em uma barca, à reboque de um vapor cujo nome não me recordo. Esta façanha foi dividida com o Cel. Fonseca, só que este deu preferência a um “CHEVROLET”, que considerava mais bonito. Foram, portanto, os primeiros automóveis da cidade, fato que causou grande admiração. Uma façanha realmente importante, visto que eram os carros do ano. Carros de fabricação americana.
Trouxe a primeira máquina de escrever. Quem gostar de história pode anotar. Foi uma “Underood”, que ficou na loja durante muitos anos. Digo mais, a primeira pessoa que aprendeu a escrever em máquina em Balsas foi o meu tio Cazuza. Depois, o meu tio Luís Aurélio. Os matutos daquela época ficavam abismados vendo aquelas letrinhas saindo tão certinhas, tudo no alinhamento certo. É, essas coisas precisam ser ditas para que os historiadores registrem mais tarde.
As suas chegadas em Balsas, quando vinha das viagens de negócios que fazia para Floriano, Teresina e São Luís, constituíam um grande acontecimento para a criançada. Trazia um presente para cada menino, incluindo aí todos os sobrinhos. Era uma festa para todos. A expectativa era enorme pelo desembarque da mala dos brinquedos.
No ano de 1928 viajamos juntos, ele, a Mamãe e eu, ocasião em que em São Luís fui operado das amídalas. Diga-se que foi a segunda operação desse tipo que se fez lá, praticada pelo Dr. Aníbal, grande médico que tinha chegado recentemente do Rio de Janeiro. Nesse tempo não havia anestesia local. A mesma foi feita “ao vivo”. Tenho as melhores recordações da infância em sua companhia. Foi um verdadeiro amigo. Proporcionou-me todas as alegrias, satisfez-me todos os sonhos de criança. Foi enérgico nas horas precisas e sereno como a brisa das madrugadas de Balsas. Os poucos anos que passamos juntos foram suficientes para reconhecer nele a figura de um verdadeiro e querido PAI.
Trabalhou muito. Deixou um patrimônio bastante razoável, nós não conseguimos mantê-lo. Não faz mal, patrimônio muito maior e muito mais valioso é a sua memória, que é sagrada para todos nós. O seu nome está perpetuado na família. Todos o amam de coração.
Lembro-me de uma cena que mantenho viva na memória, jamais poderei esquecer pela maneira como se passou: ele já se encontrava bastante doente, vítima de pertinaz moléstia que o atacou. Naquele tempo não havia cura para o mal. Perdeu muito peso, estado de extrema fraqueza. A minha Mãe retirou todos os espelhos da casa para que ele não se impressionasse. A minha prima Hilda Pereira não estava avisada desta providência e, chegando lá, ele pediu:
- Hilda, apanha ali aquele espelho na gaveta da cômoda.
A mocinha atendeu. Ele se olhou e depois de alguns minutos disse:
- Estou acabado...
Estava mesmo. Os seus restos mortais encontram-se sepultados para sempre na Praça da Catedral, ali era o cemitério da cidade. Quando foi para mudar para o novo cemitério, nada mais foi encontrado, a terra já tinha destruído tudo. O que existia na Capela do cemitério era apenas simbólico, só para manter a tradição.
O que ficou mesmo foi o seu exemplo, a memória, a dignidade de sua vida. É difícil passar um dia em que não me lembre dele.
Mãe: Maria Ribeiro da Silva nasceu na cidade de Loreto, Estado do Maranhão, tendo vindo para Balsas ainda menina. Quando chegou com a família foram morar na Tresidela, não havia casas na cidade, tiveram que se alojar numa casinha de palha. Posteriormente mudaram-se para o lado de Balsas.
Teve uma infância normal na cidade onde viveu, ao lado de suas irmãs: Corina, Albertina, Ritinha e Lourdes. Pode-se dizer que não teve juventude, visto que casou com apenas 16 anos de idade, começando aí uma vida de muita luta e preocupações.
Do casamento nasceram 14 filhos, sendo que 5 deles faleceram em tenra idade, só isto constituindo motivo para o seu grande sofrimento. Naquele tempo os recursos médicos eram diminutos, a dificuldade era enorme, não havia para quem apelar. Não foi possível evitar esses desagradáveis acontecimentos apesar do esforço que fez.
Ficou viúva muito jovem ainda, com apenas 36 anos de idade. Depois da morte do meu Pai ela tentou por alguns anos “tocar” os negócios em Balsas, que foi impossível, em face de dificuldades de toda ordem.
O seu maior sonho sempre foi manter os filhos nos estudos, o que se tornou impraticável, residindo no interior. Resolveu transferir-se para Teresina, já nessas alturas com o filho Ribeirinho formado em Farmácia e a Zenóbia professora.
Foi uma mulher de extrema coragem. Jamais esmoreceu diante das dificuldades que enfrentou. Soube manter a ordem e a dignidade da família, lutando contra as adversidades sempre com muita galhardia.
Tinha um gênio bastante forte, ela mesma reconhecia isto, mas nas horas de necessidade dos filhos sabia ser a Mãe carinhosa, atenta, sempre disposta a sacrificar tudo para dedicar-se integralmente a quem dela estivesse dependendo.
Hoje sabemos reconhecer as razões que tinha quando reclamava das nossas falhas. Naquele tempo pensávamos que era exagero da sua parte. É sempre assim, o reconhecimento só vem muitos anos depois, quando a gente também passa pelas mesmas dificuldades.
Gostava muito de ler e graças a isso conseguiu formar uma cultura geral razoável. A sua palestra era agradável, tanto pelo timbre de voz, como pelas citações que fazia.
Quando se encontrava aborrecida com qualquer um dos filhos, costumava dizer:
- Eu só quero quem me quer. Ou então dizia:
- Minha gente, eu sempre ouvi dizer que a ingratidão tira a afeição.
Quando fazia qualquer referência a uma pessoa orgulhosa, era comum se ouvir dela esta expressão:
- É preciso ter cuidado, porque o orgulho se abate.
Era muito voluntariosa, sabia perseguir os seus objetivos, e quando conseguia uma vitória, dizia:
- Triste da coisa que eu botar o cavalo em cima!”.
Nas ocasiões que atravessava algum perigo, como durante as tempestades que eram comuns em Balsas, falava:
- Estamos com Deus e com a Santa Cruz, salvai a nós todos Jesus. Ou então era assim:
- Nas horas de Deus e da Virgem Maria.
Muito religiosa, sempre que nos atendia para fazer qualquer passeio que trouxesse algum perigo não deixava passar sem a recomendação:
-“Vão todos beijar os santos primeiro”. Tinha um pequeno oratório, muito bem cuidado, com as imagens dos santos de sua devoção.
Era Zeladora do Coração de Jesus, uma entidade religiosa muito antiga, à qual pertenciam quase todas as senhoras de nossa terra.
Já no fim de sua vida, dizia que agradecia à Deus ter vivido muito, para assim poder se arrepender de seus pecados. A sua fé era inquebrantável e soube conservá-la até os seus últimos dias.
Sofreu muito antes de falecer. Suportou tudo com muita resignação e manteve a calma até o fim.
Estava eu em viagem de Fortaleza para Balsas e quando lá cheguei recebi a triste notícia. Infelizmente não pude assisti-la nos seus últimos momentos.
Havia completado os seus dias. A sua missão na terra estava fielmente cumprida.
Que Deus guarde a sua alma.
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