quarta-feira, 29 de junho de 2011

A MINHA INFÂNCIA



         O meu nome é Alberto Ribeiro da Silva, filho de João Ribeiro da Silva e de Maria Ribeiro da Silva. Nasci na cidade de Balsas, Estado do Maranhão, no dia 25 de julho de 1919.
         Posso afirmar com toda convicção que tive uma infância bastante feliz. Os meus pais deram-me tudo que uma criança pudesse desejar naquele tempo, residindo numa cidade do alto sertão maranhense, cuja ligação com os meios que se diziam civilizados era feita através do maravilhoso e lendário Rio Balsas, do qual muito terei que falar nestas notas, visto que está sempre ligado ao coração de todo balsense. Tenho as melhores recordações da infância e, no decorrer deste pequeno relato, procurarei descrevê-las da melhor maneira que me for possível.
         A primeira professora de quem me recordo, que me ensinou as primeiras letras, foi a madrinha Teresinha, que muito fez pelo ensino de Balsas, abrindo caminho na mente de muitas crianças, contribuindo, e muito, para a felicidade de várias gerações.
         Sua escola funcionava em uma das salas de sua residência, que ficava na Praça Getúlio Vargas, em frente à Igreja de Santo Antônio, da qual era zeladora. Era beata do Padre Cícero e, juntamente com sua inseparável amiga Serafina (a Ifina), era zeladora do Coração de Jesus e também responsável pela manutenção da Igreja.
         A escola era de extrema simplicidade. Apenas uma grande mesa, uma palmatória, uma tesoura, uma pedra redonda que se chamava “licença”, visto que servia de salvo-conduto para os alunos poderem ir ao quintal para as necessidades fisiológicas, um de cada vez. Cada um que desejasse sair, tinha que levar a pedra.
         Cada aluno devia levar de casa a sua cadeira, visto que na escola não existiam, apenas dois bancos de madeira destinados aos alunos que não pudessem levar a sua cadeira.
         Mesmo assim, usando métodos que hoje se consideram inteiramente superados, ela tirou da ignorância uma quantidade enorme de crianças de todas as camadas sociais. Foi uma verdadeira heroína. Balsas tem uma dívida de gratidão à madrinha Teresinha, que jamais poderá pagar.
         Freqüentei por algum tempo a escola de minha tia Lourdes Pereira, que, juntamente com a amiga Sussu, também contribuíram nos primórdios da educação em nossa cidade. Sua escola já possuía alguma coisa diferente, pois até fardamento se usava.
         Mais tarde fui matriculado, juntamente com o meu irmão Aluízio na escola primária da professora Maria Justina Serrão, vinda de São Luís para lecionar em Balsas.
         Era uma moça que se trajava muito bem, morena bastante escura, e que soube pelo seu caráter e serviços prestados angariar ótimo conceito no seio da família balsense. A propósito, lembro-me de um episódio que marcou bastante o meu espírito de criança. A professora Maria Justina chegou em nossa casa para uma visita e logo eu procurei cercá-la de todas as atenções possíveis. Posso dizer que a minha intenção era mesmo bajular a professora, visto que eu era aluno novato e procurava agradá-la de todas as maneiras. No decorrer da conversa com minha Mãe, esta perguntou como iam indo os meninos nos estudos. A minha grande decepção veio quando ela disse que o Aluízio ia muito bem, já estava lendo corretamente, mas, “este nosso amigo aqui”, apontando para mim com o dedo indicador “está me dando muito trabalho”. Na ocasião fiquei com muita vergonha, mas, até que serviu para que eu procurasse maior aplicação nos estudos. Guardo esta lembrança com muito carinho, tendo ficado na minha memória apenas pelo inesperado da resposta.
         Estudei também no Grupo Escolar, tendo como professora a minha irmã Zenóbia. A minha passagem por lá não foi muito proveitosa, pois reconheço e proclamo que era mau aluno. Apesar da capacidade da professora não obtive boa desenvoltura, o que me custou algumas reprimendas por parte de minha Mãe.
         Uma das maiores preocupações dos pais naquela época, em Balsas, era conseguir professores para os filhos. Lembro-me de que meu tio João Batista, pai da minha futura mulher Zisile, foi também meu professor por algum tempo. O Batista era homem de grande inteligência, espírito aventureiro, tanto assim que muito jovem ainda deixou a cidade, seguindo para o Rio de Janeiro, façanha difícil naquela época, regressando alguns anos mais tarde depois de ter servido ao Exército.
         Tal como João Batista de quem nos fala a Bíblia Sagrada, também ele foi um precursor, no caso, da imprensa em nossa terra, tendo fundado o jornal “O Lábaro”, que, apesar das incríveis dificuldades, circulava todas as semanas.
         Fundou a Sociedade Operária São José, a primeira do gênero em toda aquela região. Foi, portanto, o primeiro jornalista de Balsas. Teve a grande infelicidade de adquirir uma doença que hoje é reconhecida pela Organização Mundial de Saúde, mas que na época era tida como degradante, o alcoolismo. Não recebeu da sociedade os cuidados que hoje se dá às vítimas desse mal, e infelizmente conviveu com ele até a sua morte, o que se deu prematuramente aos 34 anos de idade. Deixou a esposa, Nemézia Santiago Pereira e quatro filhas: Francisca Amasile (Zisile), Zélia, Teresinha e Hermelinda, de quem falarei mais tarde em outros tópicos destes rabiscos.
         Pelos idos de 1933 fui mandado para Carolina, juntamente com dois primos, Antônio e  Deusdedith. Ali ficamos o ano letivo internos na residência do Professor Odolfo Medeiros, grande educador maranhense, homem de grande cultura, inclusive bom maestro. Foi um ano bastante proveitoso, pois recebemos daquele grande homem muitos ensinamentos, não só na área da educação, mas, de um modo geral, de conhecimentos da vida. O professor Odolfo Medeiros foi um MESTRE com todas as letras maiúsculas. Vai aqui o meu preito de homenagem e gratidão por tudo que ele me ensinou.
         Depois desse ano em Carolina, para onde fomos e voltamos em viagem a cavalo, em companhia do Tunim, nosso avô, regressamos a Balsas para um rápido período de férias.
         Estava aí praticamente terminada a infância, pois já com catorze anos de idade segui para Teresina, a fim de enfrentar o famoso exame de admissão, para poder entrar no ginásio. Viajei a bordo do vapor “15 de Novembro”, que era uma das embarcações que faziam o percurso de Parnaíba até Balsas e vice-versa, conduzindo passageiros e mercadoria de toda espécie. Lá mais para frente, quando chegar ao capítulo “Flagrantes da Vida Balsense”, procurarei relatar mais alguma coisa da infância, sem dúvida a melhor fase de nossa vida.
         Em Teresina fiquei os primeiros meses, de janeiro a junho, hospedado na residência de um amigo da família, Sr. Félix Pessoa, proprietário de uma das embarcações de navegação da época. Todos os membros daquela distinta família dispensaram-me ótimo tratamento. Dona Lígia, esposa do Sr. Félix, Dona Amada (sogra) e os filhos do casal foram extremamente gentis para comigo.

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