Filho de Antônio Pereira da Silva e Hermelinda Pires Ferreira. Nasceu em Balsas, foi um homem extraordinário, autodidata, muito cedo deixou a sua terra em busca de novos horizontes. Em Teresina prestou concurso para a Fazenda Federal obtendo aprovação. Morou em Salvador por algum tempo, ocasião em que aconteceu um episódio em sua vida, que ele contava com a maior naturalidade, até dando sonoras gargalhadas.
Estava ele com a família toda doente, em grande dificuldade financeira, quando resolveu telegrafar para os parentes em Balsas, solicitando ajuda, em face da situação que era realmente muito difícil.
A Mamãe e a Itinha, suas irmãs residentes em Balsas, resolveram movimentar toda a família para ajudar o irmão em dificuldades. Conseguiram uma “grana” até razoável para a época e mandaram pelo correio, visto que naquela época não havia bancos na cidade. Quando recebeu o aviso mandou a sua mulher, Belinha, para receber o dinheiro, pois na ocasião ele também estava doente.
O povo diz com muita sabedoria:
- Quando Deus dá a farinha, o diabo vem e fura o saco.
Pois não é que a mulher perdeu a bolsa com todo o dinheiro, dentro de um bonde em Salvador? Parece mesmo coisa do “tinhoso”. Ele não se abateu com a acontecimento, enfrentou com naturalidade e terminou vencendo tudo.
Encontre-me com ele muitos anos depois em São José dos Campos, funcionário da Alfândega de Santos, muito bem situado na vida, ganhando rios de dinheiro. De uma feita, quando falava para a Mamãe do tanto de dinheiro que ganhava, essa lhe perguntou:
- Luís, e o que é que você faz com esse dinheiro todo ?
Respondeu com aquela alegria que Deus lhe deu:
- Gasto tudo com baton e ruge para essas meninas, referindo-se às filhas que eram muito gastadeiras.
Ele chegou a me dizer um dia:
- Seu Alberto, dinheiro lá eu estou aparando é com bacia, não é mais de colher não !
Efetivamente era dinheiro que “dava no meio da canela”.
Era um contestador de primeira qualidade. E, como eu também sempre fui tido como tal, vivíamos em constante e animadas teimas, pelos mais variados motivos.
Chegou um dia num automóvel “Braslava” novo, zero quilômetro. Andei um pouco no carro e não gostei, fazendo ver a ele o meu ponto de vista. Disse ele:
- Você não sabe o que é automóvel, seu Alberto, isto aqui é fabricado por “comunista”, gente que tem vergonha.
Tempos depois apareceu num “Opel” e eu lhe perguntei:
- E o Braslava, tio Luís? Resposta:
- Aquilo é o pior carro do mundo, não vale coisa nenhuma, não pode subir uma ladeira que fica se mijando todo. É uma desgraça.
Em plena campanha do Jânio Quadros, tivemos muitos “pegas”, sendo que ora ele estava a favor, ora contra o Jânio.
Era uma graça. Havia dias que ele fazia rasgados elogios ao Jânio e encontrava a minha oposição, ao passo que logo depois dizia horrores do homem. Até parece que ele fazia tudo aquilo com a deliberada intenção para o debate. Mas não era nada disso, acontece que o homem era teimoso mesmo.
Mais tarde, nos encontramos novamente em Balsas e saímos juntos para um passeio pela cidade, andando a pé, para melhor apreciar e relembrar as coisas de nossa terra.
Quando chegamos na Praça Gonçalves Dias, bem em frente à casa que hoje pertence ao deputado Francisco Coelho, ao lado do Joaquim Coelho, ele parou, olhou muito tempo para a casa e disse:
- Pois é, seu Alberto, nesta casa foi onde se deu a maior desgraça de minha vida.
- E o que foi, tio Luís ?, perguntei.
- O meu casamento, disse ele até um tanto emocionado.
- Mas o juiz não lhe perguntou se era de sua livre e espontânea vontade?, indaguei. Disse ele então:
- É... mas se eu caísse na besteira de dizer “não”, eles me crivavam de faca”, referindo-se aos dois cunhados que estavam lá fora aguardando o resultado.
A moça tinha sido roubada e os homens pertenciam a uma família, conhecida como muita violenta.
Lembrei-me de outra muita boa do tio Luís.
Viajava ele pelo interior do Maranhão na época que estava atacando uma grande epidemia de gripe: a famosa gripe “espanhola”, que matou muita gente por esse mundo afora.
Chegou numa casa já bastante tarde e pediu “arrancho”, como se dizia. Bem recebido pelo dono da casa, que era seu amigo, durante a conversa soube que há uma semana atrás tinha morrido naquela casa um membro da família, de morte natural. Como tinha verdadeiro horror a defunto, como ele mesmo confessava, resolveu sair da casa e viajar mais duas léguas, chegando em outra morada completamente extenuado, pela longa jornada que tinha feito.
Foi chegando e logo se deitando numa grande rede que estava armada no alpendre. Ali
tirando logo um belíssimo sono. Quando acordou e se encontrou com o dono da casa, que também era seu amigo, trocaram esse diálogo. Disse o tio Luís:
- Bom dia amigo, como vão indo as coisas, como é que vai a gripe por estas bandas ?
Ao que o cidadão respondeu:
- Matando muito, seu Luís, ainda ontem morreu um aqui em casa, nessa dita rede que o senhor dormiu. A rede era dele. Enterramos hoje, estamos chegando do enterro.
Vejam os senhores: escapou do espeto e caiu na brasa. Não teve muita sorte com a família. Muito desajustamento, os filhos não souberam compreender aquele homem, que, com os seus defeitos e virtudes, só pensava no bem-estar de todos.
Faleceu em Santos, soube que em condições tristes, abandonado pela segunda mulher e pelos filhos.
Uma tristeza... Assim é a vida.
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